Quando o CEO se torna uma ilha

A SOLIDÃO NAS ALTAS POSIÇÕES DE COMANDO

Não é segredo no mundo corporativo, que alguns altos cargos são tão “paparicados” quanto isolados. Independentemente do nível do profissional na organização, todos precisam estar preparados para a dualidade nas relações de verdade e omissão entre gestores e equipes. É um tema de difícil digestão e em muitos casos, o pessoal do RH “equilibra os pratos”, desde que o processo compense nos resultados.

Equipes unidas por um objetivo comum, frases motivacionais de impacto e workshops de liderança, fazem um inegável efeito positivo nas organizações, com prazo de validade relativamente curto.

Para explicar o que isso pode significar naquele ambiente, tomo como exemplo a posição mais elevada da empresa, o CEO, lembrando que esta análise vale também para as outras posições da alta e média gestão. Na realidade, a cadeira do CEO é uma posição solitária, com diferentes níveis de intensidade na solidão. O executivo precisa ter habilidade de relacionamento, se não quiser acabar sem amigos. Evitar ofensas, desprezo, agressividade, assédio moral e reter informações, que deveriam ter sido compartilhadas, abrem o primeiro capítulo do manual: “Como ser um CEO ilhado, sem estar isolado, e conseguir obter as informações que necessita para conduzir o negócio adequadamente”.

Embora não seja uma regra, felizmente, salvo também exceções quando o CEO é uma estrela do tipo pop-star ou showman, a posição inspira paixão e ódio e, para este caso, não é bom que haja dualidade, pois, o CEO não medirá esforços para manter a equipe em operação e em busca das entregas com as quais se comprometeu. Sentimentos negativos de colaboradores, como rancor e raiva, em nada agregam para a organização e, pior, afetarão a saúde do próprio indivíduo.

Cobranças, pressão e adrenalina, sempre existirão no ambiente corporativo e espera-se tudo isso de um CEO responsável, afinal, ele tende a ser a imagem da própria organização e uma empresa, apesar de ser feita por pessoas, não é uma entidade beneficente. Todo investimento privado realizado em organizações com fins lucrativos precedem o gestor que buscará sempre o retorno adequado e o cumprimento de metas estratégicas.

Quando nenhum desses é satisfatório e o nível de tolerância dos investidores atinge o limite inferior da curva, é exatamente o CEO quem assina o cheque final com o seu próprio cargo e posição.

A entrada do CCO no processo

No dia a dia do mundo corporativo a figura do CEO é temida veladamente por boa parte de seu próprio corpo diretivo. Quando a organização possui governança e um tamanho suficiente para um board constituído no país de origem ou localmente, surge a figura do CCO (chief compliance officer), temida por muitos, inclusive pelo próprio CEO, afinal, um relatório ruim emitido pelo CCO para o board pode colocar o CEO em situação delicada, mesmo que essa não seja a intenção.

CCO tem poder, mas, será que quanto mais distante estiver de alguns executivos, menor o sinal de problemas à vista? Não é bem assim. Se o CCO não tiver respaldo e motivação do board, tenderá também ao isolamento, pois poucos querem receber a sua visita. Ele é pressionado para não reportar problemas para a matriz e isso já explica tamanha rejeição. Todavia, distanciar-se do CCO é um grande erro.

Aproximar-se do CCO é sinal de maturidade

Os bons líderes corporativos, comprometidos com a empresa e empenhados em não cometer erros de procedimento, devem se aproximar do CCO e trabalhar com ele. Assim, corrigir falhas que possam levar a empresa a perdas que afetem o resultado global ou até mesmo evitar atitudes que conflitem com os padrões éticos, valores morais e normas corporativas.

A função do compliance não é punir, mas, orientar. Contudo, executivos inseguros ou despreparados preferem isolar o CCO. Uma pena, pois perdem a oportunidade de aprimorar os seus processos internos e assegurar a confiabilidade generalizada.

Quanto ao CEO, a situação é mais profunda e dependerá só dele. Sua função se confunde com o cargo de presidente e será a governança corporativa da matriz a definir seu nível de autoridade. O CEO tem a responsabilidade de conduzir o negócio e apresentar resultados para o conselho administrativo, mas quanto mais o CEO endurecer o jogo e cobrar resultados de seu corpo diretivo, alucinadamente, maior será a chance de se tornar uma ilha, afinal poucos têm a coragem de levar notícias ruins para o chefe.

É nesse momento que o executivo pode ser enganado, principalmente quando o CEO fizer o estilo “matador de mensageiros”.

A solidão nas altas posições de comando

O gestor experiente sabe que boa parte de toda “paparicação” decorre exclusivamente da posição e do cargo que ocupa. Mesmo assim, alguns se iludem com a sedução e podem até pensar que vivem cheios de amigos corporativos e também fora da empresa.

As posições de grande destaque despertam interesses e interesseiros. Logicamente, o profissional equilibrado deve estar preparado para isso e às vezes, um bom mentoring – preferencialmente de um ancião – pode ajudar. Ter um mentor, mesmo quando o executivo já se considera um profissional experiente, não é demérito algum, pelo contrário, pode ser uma ótima estratégia.

Vários líderes e gestores bem-sucedidos, em altas posições globais, contratam um mentor em algum momento crítico de sua carreira, mas é fundamental que tal necessidade, se houver, seja identificada antes do líder se tornar uma ilha.

O canto da sereia organizacional

CEO precisa saber blindar-se das pompas e dos sons emitidos pelas sereias, implantando com habilidade a coesão de seu corpo diretivo e a fidelidade, com verdades. Jamais o profissional deve perder o respeito com seus colaboradores e na maioria das vezes, quando isso ocorre, a atitude é percebida pela equipe como insegurança do próprio gestor. O executivo conseguirá obter as informações que necessita para conduzir a corporação se demonstrar acessibilidade, coerência, senso de justiça e transparência. Contudo, não deve se iludir, pois no exato momento em que não tiver mais o sobrenome da empresa em seu cartão de visitas ou nas entrevistas para a mídia especializada, saberá efetivamente quantos amigos semeou e cultivou ao longo da sua gestão corporativa.

Este texto é bastante provocativo e embora pareça radical, com aspectos de unilateralidade, meu objetivo é alertar aos líderes e gestores sobre suas responsabilidades na “Potência Corporativa”, não apenas despejando adrenalina controlada nas equipes para que atinjam as metas e assegurem os resultados, mas como partícipes da atmosfera e garantidores do bom clima organizacional.

O exemplo do CEO serve para mostrar que a questão das relações interpessoais no ambiente profissional e seus efeitos nos resultados, na capacidade de inovação e intraempreendedorismo, começam a partir do “topo da cadeia alimentar corporativa”, possuindo relação de “mão dupla”.

As ilhas corporativas minam a crença de um ambiente profissional comprometido com a alma e com o DNA da empresa. É fundamental que sejam identificadas e trabalhadas pelo RH, pelo corpo gestor, pelo grupo de talentos, enfim por todos aqueles que influenciam ou se deixam influenciar pelo clima organizacional. Da mesma forma que o CEO mais adequado para conduzir a empresa pode ser aquele que faz com que todos na organização consigam pensar com a “cabeça do presidente”, a empresa mais harmonizada será aquela na qual as equipes talentosas e gestoras consigam fazer o grupo C–suites da organização compreender o ambiente, aproximando-se de todos os níveis hierárquicos, transmitindo confiança, empatia e as condições necessárias para evitar a formação das ilhas.

Orlando Merluzzi

Extrato do Capítulo 11 do livro Potência Corporativa, transformando o clima organizacional e a adrenalina em resultados para a organização, da Ed. Pensamento Corporativo Ltda, 2017 – Autor: O. Merluzzi.

#Gestão #Comportamento #Empreendedorismo #Educação #Liderança

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